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Centros tecnológicos com financiamento reforçado no PRR

11 JAN 2022

Dinheiro Vivo

Centros tecnológicos com financiamento reforçado no PRR

Os centros tecnológicos e de interface vão ver os seus meios financeiros reforçados no âmbito do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), que conta com 186 milhões de euros para financiar estas infraestruturas. Em causa está o decreto-lei 126-B/2021, publicado a 31 de dezembro, e que veio estabelecer o regime jurídicos dos Centros de Tecnologia e Inovação (CTI), regulando o seu processo de reconhecimento, os princípios gerais da sua atividade, métodos de avaliação e modelo de financiamento.

 

A nova legislação, que vem também desenvolver e complementar o regime jurídico dos laboratórios colaborativos, "concretiza uma das reformas previstas no PRR, antecipando o cumprimento de uma das metas contratualizadas com a Comissão Europeia". Resulta do trabalho iniciado ainda antes da pandemia, através do Grupo de Trabalho para a Capacitação das Infraestruturas Tecnológicas, criado em janeiro de 2020, e que funcionou na dependência e sob coordenação de João Neves, secretário de Estado Adjunto e da Economia.

O objetivo é "aprofundar o esforço recente de alargamento e consolidação" da rede de instituições de interface entre o sistema académico, científico e tecnológico e o tecido empresarial, "garantindo, de forma eficiente, o apoio necessário" para dotar esta rede de recursos humanos, equipamentos, e de meios técnicos e financeiros necessários para "potenciar o seu impacto" na transferência de tecnologia e na promoção de investimento inovador nas empresas.

Com a publicação do novo regime jurídico, será aberto um período de reconhecimento das entidades existentes, "condição essencial de acesso e atribuição" de financiamento público. No total, trata-se de um universo de cerca de 70 entidades, de realidades muito distintas. O reconhecimento será válido por seis anos, "podendo ser renovado por igual período, após avaliação pela comissão de avaliação constituída para o efeito".

 

Para aceder aos 186 milhões de euros da Missão Interface do PRR, disponíveis para apoiar os CTI durante os cinco anos de vigência deste plano, os centros terão, primeiro, que conseguir o reconhecimento e, depois, passar nas avaliações de desempenho externas que serão realizadas a cada três anos. Caberá à Agência Nacional de Inovação (ANI) lançar o processo de reconhecimento, que se espera possa estar concluído até ao final de março, seguindo-se a abertura de concurso ao sistema de incentivos, o Missão Interface, no âmbito do PRR. O objetivo é que o processo de atribuição do financiamento plurianual possa estar concluído até ao final do primeiro semestre.

"Temos sempre a noção que o essencial da nossa capacidade de termos sucesso no desenvolvimento da nossa economia está muito associado ao valor económico que pode ser trazido pelo conhecimento, para reforçar a capacidade empresarial, reduzindo o défice de valor nos produtos e serviços que são colocados no mercado. E, para isso, precisamos de instituições fortes e de um sistema robusto", sublinha João Neves.

O responsável lembra que 80% do investimento em I&D no PT2020 foi feito em copromoção, o que significa que há já "uma grande interação" entre as universidades, centros tecnológicos, centros de saber e as empresas, mas reconhece que "há ainda muito a fazer". "Nota-se que há um défice comparativo face aos nossos parceiros europeus", sublinha.

O novo modelo de financiamento baseou-se na experiência do centro alemão Fraunhofer, implementando um sistema baseado na estrutura de um terço de financiamento base, um terço de financiamento competitivo (candidaturas a programas europeus) e um terço proveniente do mercado, ou seja, das atividades de prestação de serviços de cada um dos CTI.

"Não é o dinheiro todo necessário para que estas entidades se mantenham vivas, elas têm que ter atividade e assegurar, por si, os restantes dois terços, mas o financiamento base é muito importante porque se trata, muitas vezes, de atividade pré-competitivas, que o mercado não está, ainda, disponível para pagar", sublinha o governante. E não faltam exemplos na pandemia para provar a urgência deste apoio. "Coisas tão simples como as máscaras ou os equipamentos de proteção individual para os hospitais, não teria sido possível desenvolvê-los de um momento para o outro se o Citeve não tivesse já um histórico de investigação, com processos que permitiram garantir os mecanismos e os coeficientes de filtração", refere o governante.

 

Reforma aplaudida

Braz Costa, diretor-geral do Centro Tecnológico das Indústrias Têxtil e do Vestuário, concorda. "Se não tivesse havido trabalho pré-competitivo, se o Citeve não tivesse 20 anos de investimento na área dos dispositivos médicos, naquele momento, nada teria acontecido. Quem fala da pandemia, fala das questões da sustentabilidade. É preciso apoiar a capacidade de antecipação, de ir à frente, de testar soluções antes delas serem necessárias, porque essa é a grande missão dos centros tecnológicos", defende.

O Citeve "vive do que vende", mas não cumpre tão facilmente a sua missão se depender exclusivamente das suas receitas. "É muito importante que se reconheça que estas entidades têm uma missão públicas e devem, por isso, ter um financiamento de acordo com o seu contributo para essa missão", diz Braz Costa, sublinhando que "não se trata de dar dinheiro de borla, é dar dinheiro em troca da prossecução de uma missão pública".

E, por isso, o diretor-geral do Citeve mostra-se satisfeito com a nova legislação. "Eu vejo nesta reforma a concretização de uma ambição de 25 anos, de ver clarificado o sistema de tecnologia e inovação nacional e fico aliviado que finalmente se tenha encontrado uma solução", garante.

Já José Carlos Caldeira, administrador do INESC TEC, lembra a importância do reforço do financiamento destas entidades em nome da sua competitividade internacional. "A grande maioria dos países europeus tem adotado um financiamento base público indexado ao financiamento que os centros de interface obtêm do mercado, de forma a garantir que estas entidades estão efetivamente a trabalhar para o mercado. Em Portugal, historicamente, esse financiamento público tem sido muito reduzido, o que coloca as entidades portuguesas sob uma grande pressão para desenvolverem as atividades e projetos de maior proximidade ao mercado, e de interesse para determinadas empresas, deixando para trás ou minimizando as atividades mais a montante, de disseminação", diz, sublinhando que "isso é mau porque se não estivermos a acompanhar o desenvolvimento tecnológico a nível internacional, depois não teremos informação atualizada para fornecer às empresas".

A nova legislação vem, assim, dotar as entidades de interface nacionais de um modelo de financiamento "mais próximo" do que existe a nível europeu, e com isso, "torná-las mais competitivas". O que significa que o apoio que os centros de tecnologia e inovação poderão prestar um apoio às empresas "mais próximo" daquilo que é feito pelos seus congéneres europeus, e assim "reduzir a desvantagem competitiva que as empresas e os setores em Portugal tinham, pelo facto das entidades nacionais estarem com parte importante do seu financiamento muito limitado", frisa José Carlos Caldeira.

O dirigente dá o exemplo do INESC TEC que, de um orçamento anual superior a 20 milhões, o financiamento base que tem atualmente do Estado é de 800 mil euros. "Com certeza que este regime não vai anular o gap face às congéneres europeias, mas vai pelo menos diminui-lo, tornando este financiamento mais estável", sustenta.

 

Oportunidade única

Já para Joana Mendonça, presidente da Agência Nacional de Inovação, a grande mais-valia da nova legislação é vir "estabelecer e uniformizar o panorama que já existe do ponto de vista legislativo, ao mesmo tempo que dá instrumentos para fazer o acompanhamento e a avaliação periódica dos CTI". Entidades que são "atores essenciais" na transmissão de conhecimento, num caminho em que "muito tem sido feito", mas muito há ainda a fazer. "O nosso tecido empresarial tem uma grande predominância de pequenas e médias empresas que, pela sua natureza e dimensão, têm maior dificuldade em abranger várias áreas do conhecimento e os centros de tecnologia e inovação são parceiros críticos dessas empresas", sublinha.

Mas não basta atribuir verbas, é preciso garantir que elas são bem aplicadas e, neste caso, além da verificação in loco da concretização das despesas, processo já habitual nos fundos europeus, este novo diploma configura o sistema de avaliações periódicas, realizadas por um misto de entidades públicas e de representantes dos destinatários dos centros. Quando acabar o PRR, o objetivo é que os instrumentos de natureza comunitária possam ser usados para consolidar este sistema de financiamento plurianual.

E os próximos cinco anos serão "decisivos" para consolidar os CTI: "Este período é um período absolutamente crucial, porque há uma enorme disponibilidade não apenas de fundos, mas de fundos que são dirigidos para os temas em que estas entidades trabalham. Se não o fizerem agora vão perder uma oportunidade única", defende o secretário de Estado Adjunto e da Economia.

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